Estudos apontam que as consequências do consumo de bebidas
alcoólicas após exercícios físicos ainda são incertas.
Além da admiração que tenho pela psiquiatria - em
especial a área de dependência química -, desenvolvi, ao longo do tempo, um
interesse especial pela prática de exercícios físicos. Há sete anos descobri na corrida uma
opção prazerosa para manter-me em forma e ter uma vida mais saudável. Já
participei de diversos tipos de provas - simples e mais complexas - como meia
maratona, maratona e, no ano passado, completei minha primeira prova do Ironman
(modalidade de triatlon de longas distâncias).
Não foram poucas as situações em que notei atletas se
reunirem após as provas para consumirem bebidas
alcoólicas, em especial a cerveja, para se refrescar e também se reidratar.
Contudo, a realidade é que o álcool inibe a liberação do hormônio antidiurético
(ou vasopressina), resultando na diminuição da reabsorção de água pelos rins e,
consequentemente, no aumento da produção de urina - que, diferente do que estes
atletas acreditam, pode provocar a desidratação.
Muitas pessoas me perguntam sobre as possíveis
consequências (negativas ou positivas) do consumo de bebidas alcoólicas após
exercícios físicos.
Alguns estudos apontam que, mesmo em pequenas
quantidades, o álcool pode potencializar a gravidade das perdas musculares para
atletas que sofreram lesões nos músculos. No entanto, outros pesquisadores
constataram que essa substância pode agir diretamente na produção da principal
reserva energética do organismo (encontrada principalmente nos músculos), o
glicogênio - que poderia ser benéfico para os atletas.
Sabe-se também que exercícios de alta intensidade,
como as maratonas, aumentam significativamente a incidência de inflamação e
disfunções imunológicas e que algumas substâncias naturais com potentes
propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias, conhecidas como polifenóis,
estão presentes em quantidades significativas nos componentes não alcoólicos da
cerveja. Frente a isto, um estudo recentemente publicado na revista científica
Medicine and Science in Sports and Exercise avaliou o papel da cerveja sem
álcool na redução do processo inflamatório agudo e a incidência de doenças no
trato respiratório superior em corredores de maratona.
"O álcool inibe a liberação do hormônio antidiurético,
resultando na diminuição da reabsorção de água pelos rins e, consequentemente,
no aumento da produção de urina - que pode provocar a desidratação"
O estudo contou com a participação de mais
de 200 atletas inscritos na Maratona de Berlim de 2009. Eles foram separados em
dois grupos com características semelhantes (idade, condições de saúde, entre
outros fatores), sendo que todos ingeriram de 1 a 1,5 litros de cerveja sem
álcool por dia, três semanas antes e uma semana depois da prova. O único
diferencial foi que os participantes de um dos grupos (grupo A) ingeriram
cerveja sem álcool normal e o outro grupo (grupo B) ingeriu praticamente a
mesma bebida, porém sem a presença de polifenóis.
Antes e depois da prova foram coletadas amostras de
sangue para avaliar as concentrações da proteína interleucina 6 (IL6) e de
leucócitos (ou glóbulos brancos, que fazem parte do sistema imunológico), sendo
que ambos em quantidades elevadas representam um alerta de inflamação. Além
disso, os corredores responderam um questionário para avaliar o grau de
desconforto no trato respiratório superior (composto por nariz, boca, faringe,
laringe e traqueia).
Os resultados apontaram que o grupo A (consumo de
cerveja sem álcool) apresentou após a prova menores concentrações de IL6, de
leucócitos no sangue e menos desconfortos respiratórios em comparação ao grupo
B (cerveja sem álcool e sem polifenóis). Além disso, 12 dias depois da
maratona, nenhum corredor do grupo A apresentou qualquer desconforto
clinicamente relevante, ao contrário do grupo B.
Esses resultados sugerem que os polifenóis presentes
na cerveja atuam na proteção e recuperação de processos inflamatórios em
indivíduos submetidos ao exercício intenso de longa duração. Entretanto, é
importante ressaltar que não houve diferença no tempo de conclusão da prova
entre os dois grupos, sugerindo que apesar de os polifenóis serem eficientes no
combate aos processos inflamatórios, não melhoram o rendimento físico.
Embora sejam dados extremam
ente interessantes, os
participantes deste estudo ingeriram uma grande quantidade diária da bebida em
um período muito longo. Diante disso, novos trabalhos deverão ser realizados
para que se possa verificar se há uma relação de causa e efeito entre pequenas
doses e a recuperação de processos inflamatórios causados pelo exercício.
Ademais, não posso deixar de enfatizar que as bebidas
alcoólicas possuem propriedades inflamatórias, que prejudicam a disponibilidade
de nutrientes e podem diminuir a secreção do hormônio do crescimento. Dessa
forma, os resultados deste estudo provavelmente não seriam os mesmos com a
ingestão de cerveja com álcool.
Nenhum comentário:
Postar um comentário